terça-feira, 31 de maio de 2011

Por uma vida melhor: o que fere a dignidade humana não é o uso de uma variante linguística

Em relação ao que foi divulgado pelo setor de Comunicação Social da DPGU e reproduzido na mídia [leia abaixo]:

Pergunto-me: Onde estão as "incorreções" e as "informações confusas" do ponto de vista linguístico? Teria sido a obra lida pela ótica da ciência linguística? Teria sido notado que, lá na obra, não se propõe o ensino "errado" da língua, mas uma reflexão sobre o falar e o escrever genuíno da clientela a que se destina o livro e mostrar-lhe que há uma outra forma privilegiada e aceita como "norma padrão"? Ao que parece, nem leram, nem notaram... Nem refletiram.

O que impede a inclusão social é não conceber que existem outras formas de comunicação e expressão linguística numa variante diversa da dita padrão e que essa variante [com os "desvios" que contrariam a norma padrão] tem de ser respeitada a partir de contextos específicos. Não considerar isso é aprofundar o isolamento dos ditos "analfabetos e iletrados" e, assim, excluí-los socialmente.

Do ponto de vista linguístico, equivocada é a premissa de que haja o "errado" e o "certo" numa língua viva.

Dirão: mas não se ensina linguística na escola. Direi: ensina-se, sim. Basta ver a aplicação das diversas contribuições dessa ciência e de outras afins para o ensino da língua materna. 

Pergunto, ainda, como o respeito ao modo de falar de determinadas pessoas e de sua cultura linguística, por assim dizer, pode ferir a dignidade delas? 

O que fere a dignidade é a falta de atenção à educação. O descaso com que governantes têm tratado a educação deveria mover ajuizamento de ACP para que eles cumpram esse item constitucional [lembra-se de que educação é um direito de todos?]. O salário indigno recebido por professores é que deveria mover ajuizamento de ACP para que esta nobre profissão e seus profissionais sejam respeitados e não aviltados como tem ocorrido sempre.

Por fim e de uma vez por todas, ninguém está propondo o fim do ensino normativo da língua portuguesa em consonância com o dito padrão culto. Aliás, o próprio termo "culto" já insinua uma certa exclusão, não é mesmo?!?!

Se o ensino simples da norma padrão - como muitos defendem de forma encarniçada -, fizesse com que o aluno se expressasse "com a devida eloquência", não teríamos tantos medalhões escrevendo e falando de forma desconexa e incoerente... Mái dêixemu isso pra lá...




Brasília, 27/05/2011 - A Defensoria Pública da União no Distrito Federal (DPU/DF), por meio do Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, ajuizou Ação Civil Pública (ACP) para que seja deferida liminar para determinar à União Federal, por meio do Ministério da Educação (MEC), que promova a retirada de circulação dos cerca de 485 mil exemplares do livro de língua portuguesa Por uma Vida Melhor, da Coleção Viver, Aprender (Editora Global), de autoria de Heloísa Ramos, em parceria com outros autores.

O conteúdo do livro foi assunto dos jornais nas últimas semanas por considerar válido o uso da língua popular, mesmo que com erros gramaticais. Para o Defensor Público Federal Ricardo Salviano, autor da ação, as incorreções e as informações confusas presentes no material didático podem tornar-se um entrave para o pleno desenvolvimento dos estudantes, impedindo a inclusão social, o que fere o princípio da dignidade da pessoa humana. 

Na avaliação do Defensor, a atuação da DPU se justifica devido à metodologia utilizada pela autora do livro consistente no emprego da linguagem falada desprovida do respeito à norma culta. “Não se pode partir da premissa de que se deve permitir que o aluno fale errado para ensiná-lo a escrever de forma correta. A retórica da argumentação é ilógica”, explica.

Para Salviano, a linguagem informal existe e é importante que os alunos tenham consciência disso, mas o uso da norma culta deve sempre prevalecer, de maneira que o professor deve instruir o aluno a se expressar com a devida eloquência.


Na seção Brasil, do Jornal do Commercio [31/05/2011 - impresso], pode ainda se ler: 

Para o defensor público federal Ricardo Salviano, questões de sociolinguística não devem ser discutidas dentro da sala de aula. "Escola é lugar onde se dever ensinar a norma culta. Se você diz que falar errado é aceitável, está prestando um desserviço à sociedade", critica Salviano.

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