sexta-feira, 13 de maio de 2011

"Não somos irresponsáveis", diz autora de livro com "nós pega"

Uma das autoras do livro didático de língua portuguesa Por uma vida melhor, da coleção Viver, aprender, adotado pelo Ministério da Educação (MEC) para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), nega que a obra ensine o aluno a usar a norma popular da língua. Nota da coluna Poder Online publicada na manhã desta quinta-feira mostra que o livro ensina aos alunos que é válido usar expressões, como “nós pega o peixe” ou “os menino pega o peixe” [aqui].

Para a autora Heloisa Ramos, apesar de ter um capítulo dedicado ao uso da norma popular, o livro não está promovendo o ensino dessa maneira de falar e escrever. “Esse capítulo é mais de introdução do que de ensino. Para que ensinar o que todo mundo já sabe?”.


Segundo Heloisa, que é professora aposentada da rede pública de São Paulo e dá cursos de formação para professores, a proposta da obra é que se aceite dentro da sala de aula todo tipo de linguagem, ao invés de reprimir aqueles que usam a linguagem popular.


“Não queremos ensinar errado, mas deixar claro que cada linguagem é adequada para uma situação. Por exemplo, na hora de estar com os colegas, o estudante fala como prefere, mas quando vai fazer uma apresentação, ele precisa falar com mais formalidade. Só que esse domínio não se dá do dia para a noite, então a escola tem que ter currículo que ensine de forma gradual”, diz.


Foto: Reprodução Ampliar
Livro usado na Educação de Jovens Adultos tem capítulo sobre a norma popular da língua

De acordo com a professora, o livro didático adotado pelo MEC para turmas do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) foi elaborado por ela e por outros especialistas em língua portuguesa com base nas experiências que tiveram em sala de aula após décadas de ensino. “Nossa coleção é seria, temos formação sólida e não estamos brincando. Não há irresponsabilidade da nossa parte”, afirma.


Ela acredita que, ao deixar claro que é tolerada todo tipo de linguagem, a escola contribui para a socialização e melhor aprendizado do estudante. “Quem está fora da escola há muito tempo, é quieto, calado e tem medo de falar errado. Então colocamos essa passagem para que ele possa sair da escola com competência ampliada”, diz.

Em nota enviada ao iG, o MEC defendeu o uso do livro e afirmou que o papel da escola não só o de ensinar a forma culta da língua, mas também o de combater o preconceito contra os alunos que falam linguagem popular.


Apesar de defender que o livro continue sendo adotado, a autora admite que é preciso que o professores entendam a proposta para não desvirtuar o que ele propõe. O material vai acompanhado de um livro guia ao professor e os parâmetros curriculares do MEC explicam a abordagem variada da língua, mas como os livros são distribuídos para escolas de todo o país, é difícil ter esse controle.


Linguagem popular divide especialistas


A doutora em linguística e professora da Universidade de Brasília (UnB), Viviane Ramalho, vai além da opinião da autora do livro e defende que a linguagem popular seja ensinada abertamente nas escolas. “O ideal seria aprender todas as possibilidades diferentes até mesmo para respeitar o interlocutor que usa outra variedade linguística”, diz.


Para ela, essa seria uma forma da escola se aproximar da realidade dos estudantes. “Há uma exigência da própria sociedade de que o individuo saiba usar a as diversas variedades da língua”.


A linguista Juliana Dias acredita que a escola deva ensinar exclusivamente a norma culta e usar a linguagem popular apenas como exemplo durante as explicações. “O popular não cabe para o ensino. Cabe somente para reflexão, discussão, e até para o combate ao preconceito com as formas mais simples de se falar”.

Veja reprodução de trecho do livro "Por uma vida melhor":



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